segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

A burca e os direitos humanos (ou البرقع وحقوق الإنسان)


A torre de Babel (Pieter Brueghel, o velho)
O que era chamado de norma de justiça passou a ser definido como direitos humanos, mas, parafraseando Kelsen, pois me parece interessante notar que uma norma de justiça tem valor relativo, ela [a norma de justiça] é vazia de conteúdo na relação a priori, sendo constituída de sentido apenas pelo enunciado que pode ser aplicado a qualquer conteúdo. Assim, os direitos humanos, da maneira como são postos, são única e exclusivamente aquilo que alguém ou alguns, pela posição que mantém na sociedade internacional, ou melhor, nas instituições da sociedade internacional (e disso eu puxo Foucault), condiciona como verdade absoluta. E é interessante como o discurso dos direitos humanos tem um ar de naturalismo ("são os direitos que alguém tem apenas por ser humano..."), muito embora, justamente por ser humano – e me parece que Levinas é apropriado para essa discussão – a finitude do Eu é incapaz de compreender a infinitude do outro; daí não ser possível estabelecer como universal o que deveria ser compreendido dentro do rol do conteúdo definível desta norma de justiça que chamamos "direitos humanos". E mais, os direitos humanos entram como uma norma de justiça na qual se inscreve: "todos devem agir de acordo com as sub-normas de justiça elencadas pela sociedade internacional, de forma que seu agir se enquadre dentro de uma proposição universal, pois os direitos humanos são universais"...

Diante disto, pergunto a todos como fica a proibição do uso da burca na França... Onde está esse tal de universal?

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Eu... dão-me vanidade!



Dei-me, dão-me vanidade. Eu dão-me vanidade; eles dei-me vanidade. O expressionismo um dia notou, a flor da menina é a curiosidade do Golem; e Nosferatu viu que a luz é o bem de sua poeira. Eu dei-me vanidade... Eu, dão-me vanidade a mim. Felix disse à sua bolsa, amarela e preta, preta e amarela: "dê-me o que preciso!" "careço vanidade", pensou o gatinho preto... O bem da bolsa era tornar-se vazia. O pó dos móveis cobre tudo o mais, e deixa tudo o mais perplexo diante da limpeza que chega – avassaladora, rápida –, mas, logo a partícula retorna (e, se não for a mesma, outra). Por isso que um quarto branco compõe melhor com o mundo, principalmente um quarto sem móveis e, preferencialmente, sem luz (mas, sendo assim, já que não tem lume, não poderia ser de qualquer outra cor? Não, pois um dia poderá bater o sol...), para que possa restar a limpeza de uma aparência: vão no vão. Vanidade sem limites, neste quartinho... Sou eu o único móvel, o único a contemplar. A vida em contemplação: dei-me vanidade.

domingo, 4 de dezembro de 2011

Uma noção de Governança

Na verdade isto é mais uma tradução que qualquer coisa.
Me interessei por este tablete fenício do Museu do Pergamon , em Berlim.
Testamento de Kilamuwa, Rei Fenício, cerca de 825 A.C.




"Eu sou Kilamuwa, Filho de Hayya, Gabbar reinou sobre Y'DY e nada fez; depois dele veio Bamah, que do mesmo modo, nada fez. Então reinou meu próprio pai Hayya, mas ele também foi inábil. Em seu turno, reinou meu irmão Soil, que também em nada agiu. Entretanto, eu, Kilamuwa, Prole de Tamel, o que fiz, jamais fora feito pelos meus antepassados.

A casa do meu pai estava cercada de reis poderosos, e cada um deles estendeu as suas mãos  para guerrear. Eu estive nas mãos dos reis como um fogo, queimei as suas barbas , e como um fogo, devorei as suas mãos. O Rei dos Danaos fora sobrepujante, mas contra ele me utilizei da ajuda do Rei da Assíria:

Naquela época uma jovem mulher era oferecida no mercado pelo preço de uma ovelha, um homem, pelo preço de uma vestimenta.

Eu Kilamuwa, filho de Hayya, sento no trono do meu pai. Sob os reis que me antecederam, foram os Muscabinos tratados como cães, mas para eles fui um pai, uma mãe e um irmão.

Aquele que jamais sequer vira uma ovelha, o fiz senhor de um rebanho. Para quem nunca outrora vira um touro, o fiz senhor de uma junta. Dei riquezas para quem nunca possuira prata ou ouro.  Para aqueles que desde a infância não trajaram linho, eu os vesti em meus próprios tecidos de Byssus dos pés à cabeça.

Eu peguei o povo pela mão, e do fundo de suas almas, me fitaram como filhos à uma mãe.

Qualquer um dos meus filhos que venha a me suceder, e que por ventura destrua essa inscrição, que ele seja desonrado entre o povo. E se suceder de alguém causar dano às minhas letras, que o Deus de Gabbar, Ba'al-Samad esmague o seu crânio, E que o Deus de Bamah, Ba'al Hammon, destrua a sua cabeça."


Berlin, Pergamonmuseum, Stele des Königs Kilamuwa aus der Burg von Samal, Zincirli, Türkei (Stele of King Kilamuwa from the castle of Samal, Zincirli, Turkey)