domingo, 31 de julho de 2011

Paraíso em Paralaxe: estórias do Recife


Estava B. na rua da Soledade. Eram 14:37 de uma sexta-feira. Nesse momento, muito despretensiosamente, caminhava tranquilamente, relembrando como nunca fizera - talvez, justamente, porque pouco recordava - o seu caminho da Av. 17 de Agosto, na Zona Norte da cidade, até a sua paragem, na Av. Conde da Boa vista, no Centro. Ao contrário do que pensara, o percurso foi transcorrido mais rápido do que o normal, pois chegou ao seu destino em mais ou menos meia hora - algo, de fato, diferente dos habituais quarenta minutos. Lembrara-se de ter sentado no fundo do ônibus, na cadeira que dá para o corredor, o que também já não era muito habitual, tendo em vista gostava de ficar próximo à janela ou, mesmo, no corredor. Mas na verdade, não tinha preferência alguma, desde que pudesse sentar, o que já era completamente complicado, uma vez que aparentemente a frota é imprecisamente pequena e moribunda. B. sempre refletia sobre a natureza dos motoristas: se fazendeiros ou empregados, pois sempre achara que eles tinham certeza de levar gado e não gente consigo.

Durante parte do caminho, enquanto lutava contra seus impulsos dominicais, ou seja, o espectro do boceja-dorme, tentou ler a vários balouços de cabeça um pedaço de seu exemplar de em defesa da sociedade, de Michel Foucault. Isto vinha bem a calhar, pois, em volta de grande número de comuns, isto é, rodeado pela sociedade, pensava o que estaria aquele demagogo de seu prefeito fazendo enquanto ludibriava a todos os desafortunados. E, da mesma forma, imaginava as formas de produção do discurso utilizadas por um prefeito tão pouco simpático e caloroso. Mas, não foi possível para B. terminar de ler o que pretendia. Aparentemente o balanço costumeiro de sua cabeça, devido a todos os buracos provocados pelo tempo chuvoso aliado à falta de manutenção da pólis (ora, apenas mais um ato deste vândalo romano), não resistiu ao ímpeto dominical e cedeu ao rei da noite, seu colega de poucas horas, Morfeu, deus sonífero. Não conseguia lembrar de seus sonhos. É muito provável que tenha sido muito turbulenta a sua viagem, e, assim, não tenha sequer sonhado. Isto é muito plausível.

Neste momento, B. já passara da Igreja da Soledade e atravessara uma rua transversal, cujo nome jamais se indagou. estava na calçada direita da rua, mas olhava às vezes à esquerda, lugar em que via o movimento em volta de um fiteiro, ao mesmo tempo em que aguardava ansiosamente passar por uma construção, quiçá abandonada, que muito lhe interessava. Não fosse esse bendito prédio, já estaria na penúria como um bom avant-garde. Pois bem, lá estava ela, e se não suspeitasse tanto da violência, teria parado aos pés daquele prédio insignificante, abandonado, desbotado e malogrado apenas para observar as formas pelas quais um resto de natureza se espalhava através de suas paredes. Pois lá, no prédio, acima dele, por ele, havia uma árvore a crescer! Isto o maravilhava! Toda a exuberância de um resto no lixo que chamamos de lar. B. não passava de um nostálgico infeliz, mas, com toda a certeza, mais feliz por saber o que importa.

domingo, 24 de julho de 2011

B-Mashina



Este é o ano de 2011 e encaminha-se ao neo-totalitarismo. Não que já não se esteja nele, longe disto! Estamos ainda mais dentro dele. Apenas acontece de forma mais rápida e desmedida o seu encontro. Mas o que é o neo-totalitarismo? É algo que está fora dos padrões do ser político, algo que nem o próprio Estado Leviatã conseguiria dizer com facilidade, mas que é tanto mais real quanto factual seja. A sua raiz está profundamente fincada nos pés de uma mudança sensivelmente ideológica. Este é o ano de 2011 e há muito tempo encontram-se todos no neo-totalitarismo libertário. Cuidado em ambos os lados! Leste e Oeste fazem parte de um passado esquecido; o mesmo vale para algo mais remoto e tanto mais esquecido em sua essência: o Arianismo super-hominídeo. Esta é a linguagem do totalitarismo. Este é o código do rememoramento: o esquecimento cadenciado e visto à perspectiva das ondas em linhas de intersecção de memória. Deve-se esquecer para lembrar; mas não viver para superar. A experiência mostra justamente isto. Este é o método utilizado por todos os mecanismos multinacionais. E subitamente todo o povo na Terra foi pego por um vírus: alguns disseram que isto era devido à água... Quanta besteira. O problema nunca esteve na água. A água é que esteve no problema: a água, a comida, a vida, a economia. Para proteger a todos de suas memórias sobre si e sobre tudo o mais, crie-se os mecanismos de esquecimento-rememorado. É basicamente uma forma mítico-ritualística de dizer: “então, e finalmente, a sós! Eu, eu e eu mesmo. Mas não tão só... Tem o mercado para me ajudar a superar toda esta crise”. E não é que seja necessário viver lembrado, mas não viver sem não ser vivendo; e para isto ocorrer é necessário não deixar de morrer todos os dias sobre o que se foi e passar a ser outro que não o de sempre, pois o ser, e Parmênides e todos os demais sempre estiveram errados, não passa de uma mortificação, uma estagnação, um contraponto ao santo e ao corporal! Pois o santo é o corpo, não o sangue ou a alma. E nesta linha que já parece estar quase perdida em devaneios, uma salvação: sim, são devaneios; não, não são mais do que não devaneios. Contradição? Jamais! Veja-se o seguinte, e para começo de conversa, pois este ainda é o começo, não há paragrafação neste texto e isto quer dizer alguma coisa. Tem um significado significante por trás disto, mas este não pode ser revelado. Isto, quer dizer, este texto, funciona como uma mensagem subliminar, mas não se dirá aqui qual vestígio sobrará no profundo emaranhado sistemático-nervoso. Este é o senso de todo este neo-totalitarismo – não sempre foi ele a questão central deste diálogo mono-circunstancial? Simplifique-se: a libertação é a maior forma de totalitarismo, de controle da produção, de produção de uma paz, de uma passividade, sem conhecimentos de causa, pois não importa nada exceto o controle. Os atuais políticos leram um maquiavelismo perigoso à própria base do texto do Florentino; e ele treme-se no leito de vida. Leito de vida? Dat is zeer moi, hè?! E como é bonito pensar que do morto há vida, enquanto não seja post mortem, pois, queridos, a vida é maior na morte, pois já não é vida contida, mas vazio e expansão! Expansão e vida de corrupção à geração: outras formas de vida na vida que é tão só aqui e agora! E assim como era no final agora e sempre! Mas, pois bem, esta corja política utiliza-se do 1984 para fazer de todos os demais os seus larápios de dominação sem causa. E este não é mais um texto político! NÃO!

terça-feira, 19 de julho de 2011

Wirtschaft ist Tot!


Faz muito tempo que tenho tentado colocar isto aqui, mas ainda não me acho suficientemente capacitado para explicar o por quê subversivo de fazê-lo, já que eu sou o único propriamente classificado para interiorizar isso em mim mesmo por modos e mecanismos subversivos de repetição dos elementos mitridatizados. Interessante pensar que este foi um dos motivos essenciais e primordiais da criação deste  lugar profano e deteriorado. O meu material foi sempre baseado e continuará sendo baseado na tentativa constante de, se não a mim, a vós, a nós, acostumar, ainda que ninguém, alguém aos venenos. Aos venenos, eu disse, sempre aos venenos. Minhas categorias são pouco próprias e pouco duradouras diante de um sistema-extinção/sistema-criação/sistema-eternidade, mas posso repeti-lo(s) sempre que devido; incorporá-los, usá-los, mal-utilizá-los, abusá-los, deteriorá-los.

Throughout Mario Bros® games it's easy to find out a lot of tubes, pipes and turtles' shells. This is the spirit of the game: a selected repetition of the repetitive selection of the repetition of the game itself. This is properly subversive. This is the way energy seems to flow out of the stardard into something else. Mario starts the game and he goes and goes all over into the endenessless empty spaces of the core. And these aspects of subvertion makes what is really beautiful in having found out subversive shelters into subversive jumps out of the Toad-Peach situation.

Ao longo dos jogos de Mario Bros®, é fácil encontrar vários tubos, canos e cascos de tartarugas. Esse é o espírito do jogo: uma repetição selecionada da seleção repetitiva da repetição do jogo em si. Isso é propriamente subversivo. Esse é o modo pelo qual a energia parece fluir do normal a algo mais. Mario começa o jogo e ele vai e vai todo derredor até os infindáveis espaços vazios do centro. E esses aspectos da subversão fazem o que é realmente bonito em ter achado cascos subversivos em pulos subversivos para fora da situação Toad-Peach.

É assim que ocorre na música e na arte do grupo Esloveno da cidade de Liubliana, Laibach. Segundo seu conterrâneo, o filósofo Slavoj Žižek, "This is what is really subversive". E, muito embora todo o texto acima seja meu, toda a idéia seja minha, toda a construção seja minha, nada é meu... Tudo me perpassa e neste percusso, o fluxo de minhas sensações já não são mais nada. Nada também é o que se propõe Laibach; nada de inovadoramente inovador: isto significa dizer que, se por um lado há algo de extremamente inovador em seu conceito de fazer música e arte, por outro, e de uma forma muito mais profunda, existe algo, algo íntimo, algo intimamente ligado à forma de exercício do poder soberano nos estados, não importando se de primeiro, segundo, terceiro mundo, ou mesmo se, Leviatãs, redes imperiais ou mercados audiovisuais em expansão biosônica. O exercício do exército é a marcha: deve-se marchar, no caminho da subversão, sempre ao maior encontro subvertido daquilo que se subverte, nunca se afastando do objeto em questão, aproximando-se, tal qual esta marcha e este som de botas ao chão: Rechts, Links, Rechts, Links, Rechts, Links, Rechts, Links, Rechts, Links... preparem o muro, atirem-no ao chão: com isto, meus amigos, já disse Pink Floyd (não é verdade, Roger?), vai embora toda a proteção! Vivo o veneno vivo em mim, na medida em que sou veneno daquilo que subverto e ao passo que subverto aquilo que pretenderia a priori.

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Rugido: calado e contido...


Dizer que existe um modelo do feminino e do masculino é cair na armadilha de uma construção. Homem só é como ocorre biologicamente; isto vale para a mulher. Dessa forma, antes de homem e mulher como seres psicológicos, masculino e feminino como características biológicas. Eu assumo isto, apesar de também assumir o risco de aceitar a convenção: o próprio do homem e da mulher (como seres psicologicamente diferenciados), pois há uma necessidade fática de aceitar/encarar a história, a construção histórica. Isso porque, embora diga poder existir homem(s) tão mais feminino(s) do que possa ser uma mulher e vice-versa, é necessário, ainda, afirmar que ambos resistem enquanto institutos tradicionais; tradicionalmente passados e repassados enquanto convencimento do discurso.

Pois bem, o homem, como formação convencional de um discurso e, assim, como móvel pré-moldado, só pode ser isto e aquilo; necessariamente. O que é isto e/ou aquilo? Tudo o que assoma a idéia arbitrariamente estabelecida dele, sobre ele, dele sobre ele. Assim, é mais prático - se não tenho o interesse de imaginar (embora já o esteja fazendo) aqui sentados todos os leitores desesperados, ansiosos por um fim cujo fim jamais chega - dizê-lo naquilo que não é. Mais especificamente, em algo determinado pelo título deste pequeno ensaio: não é sentimental. Claro, não que não possa ser (pois disso denota que há a mesma possibilidade para sê-lo encontrada nas mulheres), mas simplesmente não o é, salvo alguns casos de segmentação social em detrimento de tendências, pois permanece subjugado ao estereótipo.

A tradição ocidental foi, então, extremamente desmedida em relação ao homem: sobressaltou alguns valores que não são necessariamente os melhores (ou sequer são bons) e relegou à mulher o papel de grandessíssima ovelha pastoreada, dizendo negativos todos os valores que faziam-se prementes nela (na sua convenção). Assim, é a mulher igualmente um ser desmedidamente construído. A isto chamou-se natureza, e disse: eis o homem; e de sua imperfeita parte uma ainda pior, a mulher. Algo, entretanto, parece estar errado nesta interação. Ficou, então, estabelecido o quadro: homem, apesar de não ser perfeito, mais próximo ao divino. mulher... já nem tanto.

O fruto da Árvore Proibida está aí para isso: a mulher deve ser frágil; o homem, no máximo, fragilizado. Pandora aparece, no mito de Prometeu, como esta eterna lembrança: por quem é o homem fragilizado senão pela mulher? E, enquanto a mulher traz a intuição, o feeling, o ser do homem é a razão. E pela razão nada mais haveria que não ela própria e suas derivadas. Assim: razão, sabedoria e contenção: a humana tripartite perfeição no/do homem exemplar. E existe algo de extremamente equivocado nessa relação (homem-razão), ela aparece como um traço da personalidade esquizoide.

Aqui, resta o homem simplesmente imperfeito (incompleto) diante de sua imperfeição, pois esquece, a bom gosto da tradição, o seu mais instintivo instinto: o sentir, pulsar. Fica, por conseguinte, calado: contido. Guarda e resguarda-se, recalca e retira-se. Ruge em casa, sozinho, e gralha ao mundo em coloridas penas de desespero - pavão entorpecente. Em busca de ataraxia e temperança, um só sinal: falta de si, de rosto, de outro. No palco do tragicômico, a máscara da fluidez.




terça-feira, 12 de julho de 2011

Recife's Business School!


Pois bem, não sei se foi por conta de um ódio que me diminuia ou do simples e profano desejo de briga e de confusão que com esforço tentava controlar - muito embora penso ter sido tão só o acaso - fui assaltado enquanto parado e disperso. Na verdade, nem tão disperso estava, apesar de que isto não fez como não faz qualquer ínfima diferença. O chão é sempre o chão: e demora para dele se sair. Não havia jeito, senão o próprio assalto e a resiliência.

Entra, então um estranho no carro; um estranho em um carro estranho. Daí ao ponto de ser o carro (outrora tão meu, tão eu) um estranho, também, já não foi tanta surpresa. Eu e o carro quando éramos um só, íntimos; depois, éramos vários, descentrados e desconhecidos. Surpreendemo-me, entretanto, não ter-me desobedecido como faz um cavalo confuso ou em fúria. Aliás, muito pelo contrário! Serviu-me tanto melhor. E quanto melhor nos servem os estranhos...

Com toda certeza, após o incidente, este deve ou pode ter sido o pensamento dos colegas ladrões. Pois os seus só servem a si quando é fácil, quando não têm medo; quando, em suma, lhes é conveniente. Claro, que pode ou deve ser conveniente servir enquanto isto for alimento ao ego e ao hábito, ainda que não seja tão fácil, que lhe cause medo ou não seja conveniente a priori. Ego e hábito, formas de justificar o servir alguém próximo.

Assim, rodamos e não foi pouco; quase um belo passeio, um city tour. Fomos do Espinheiro até Casa Amarela; dali para Apipucos e quase chegamos em Dois Irmãos. Depois, fizemos, ou melhor, desfizemos o percurso corrido. Destino? Santo Amaro. Um belo lugar para nos soltar, pois é central, não é mesmo? Claro, belo lugar uma ova! Estávamos sendo assaltados, mais precisamente, em linguagem técnico-jurídica, sofríamos "extorsão mediente sequestro".

Mas verdade seja dita, de certa forma, a situação foi até suavizada; atrevo-me, parcialmente controlada por nosso autocontrole - meu e de minha mulher. E mais, foi mais controlada pelo sentimento de controle que nos deixamos impressionar, incutir pela paixão - como quem sofre. Quanto aos dois meliantes? Acalmaram-se, enfim. Sabiam que estava na reta; não na nossa, óbvio... A grana estava.

Assim foi... Paramos, sacamos; sacaram e gostaram. Partimos e obedecemos. Fazíamos ali quatro anos juntos - e, deveras, talvez nunca tenhamos sido tão cúmplices! Ali já não era mais Eu e Ela, éramos Nós, juntos e indissociavelmente perplexados e mortificados e aquebrantados e apaixonados. Parabéns e obrigado, minha linda! Um conto a mais para nossos filhos e netos e por ai a fora!