quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Vorname - uma visão ameríndia de Anaximandro




Ouçam as vozes mutiladas! Chamem, clamem, berrem, urrem! Já não é sem tempo! Tragam a flor, a linda dor, o ferimento da chaga a provar! Sou povo sem rosto, danço de lá! Meu nome é ninguém - nulisseu - e sou homem, forte e destemido! Resguardo em meu peito a marca das gentes; a tradição!

À vida vim do nada e para lá devo voltar: ao ápeiron, a totalidade da justiça equilibrada da natureza! minha canoa, no rio da morte, é de palha; é feita para afundar. Meu fumo é meu amigo, ainda que não saiba fumar. Esse é meu lugar, junto à essência de tudo, ao infinito incorruptível. Devo respeitá-lo. Danço em meu assombro.

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Dez palavras pela meia noite.


É difícil encontrar alguém que não pense em ser melhor todos os dias. Claro, não pretendo tomar isto como uma regra geral, longe de mim. Vai ver, na realidade, eu é que sou assim e me acostumei a conviver com pessoas, que por um acaso também o são. Ainda assim, se eu tomo por certo que uma parte vive dessa forma, eu poderia dizer: a pior fase da vida de um homem - depois de ter-se habituado a pensar ter um tal grau de excelência - é ter de repensar essa sua "perfeição". Como é banal pensar que o problema é o fiapinho de poeira no ombro esquerdo do outro. Como é fácil apontá-lo. Acha-se até que ao se demonstrar as armadilhas que os outros caem, pelo simples fato de as perceber, está-se, também, evitando-as para si: não existe maior erro, eu penso. Mas que decepção! que decepção, de fato...

As máscaras parecem ser uma realidade. Vista sua capa, rapaz; entre para o time: nós precisamos de você conosco. Este é o grande e proliferante time dos fracassados (assim como eu, vós, tu e você). Que grande engano é pensar que ao varrer um sentimento para baixo do tapete e esperá-lo dissipar, estar-se-ia a fugir deles. Até talvez esteja: quem sou eu para dizer?! Só posso falar sobre o que me atém, nada mais. Não quero plantar o universal, pois não sou todos vocês, não é? A questão toda é: do que adianta apressar os passos se em algum momento o cansaço e o medo chegarão? É aí que se realizará a maior dominação de todas: a de si sobre si. Não é para menos que é tão engraçado pensar que todos os seus complexos aportarão com a maior violência jamais vista e de uma só vez naquele instante (eternizado) que é a crise.

Venha amigo, caminhe comigo, falam os traumas d'outrora. Caminhe, não se acanhe; não me abandone. Siga, siga, dance comigo, dance pra mim. Essa é a hora de mostrar os seus passos de artista; artista da fome, em busca de atenção: acreditando ter um sentido maior em si e nos outros. Se hoje acordei com as pernas pesadas, inchadas e moribundas é porque, como só havia de ser, estou infatigavelmente fatigado. Eis a crise. Eis a crise. Eis a crise. Diz seu ego a si: coloca um sorriso nessa cara, faça isso por mim e vamos resolver tudo juntos: eu converso com teus problemas e tu conversas comigo, mas não vás tratar diretamente com eles, pois não queres tu, agora, se machucar, não é? deixa pra depois. Que venha tudo de novo, em outra hora, outro tempo, em outro eu, tu, quem quer que seja... Se o corpo é o lugar das trocas celulares e dos movimentos metabólicos, a mente é o lugar das ruínas. Ri.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

às margens de um profano: uma visão do direito



Eu sempre me impressiono com Henri Robert[1]. Parece que foi ontem que li o seu Les Grands Procès de l’histoire – quando na verdade já tem mais de um ano (mas o que é o tempo para as grandes obras?). Para ser sincero, o meu primeiro aperto de mão com esse Senhor não foi dos mais afáveis: encarei-o com a estranheza necessária ao desgosto. Pois bem, que contra-senso! Como poderia eu pensar que um advogado poderia me impressionar tanto com um saber literato? Nele não vem só o superficial toque da garra-lei.

Quando venho pegando esses infindavelmente incassáveis diários da monotonia que são os livros de doutrina (aquele momento dogmático é – e ainda bem que o é – momentâneo; encerra-se no instante do momentum) para poder me aprofundar em conceitos que nunca são mais do que obviedades silogísticas, não vejo escapatória:

-Bruno: Amigo, por favor, traz-me um banco.
-Amigo: Para quê?
-Bruno: É porque eu já tenho a corda, o prego e o martelo: vou preparar meu cadafalso.
-Amigo: Ah! Não tem problema, com prontidão! Creio seja para fugir do morto e sem cor, não?!

É na contramão de toda essa corja de autores-repetidores, “parafernálios” da cópia e da venda[2] que está o tipo de Henri Robert. Viva o jurista além da régua, do codex e do cadeado. O direito, aliás, não é religião para aceitarmos tanta languidez. Dê-se paixão a cada movimento.


[1] Advogado francês (1863-1936)
[2] Schopenhauer (O Ofício do escritor) critica ferozmente o escritor que visa o lucro.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

A Tirania da praticidade


Da tirania da praticidade.

Desperto. Metálico lembrete sonoro do movimento temporal.
Erguer-se sob um morno horizonte, contemplativo:
(Re)Começa tudo.
Desperdício?
Pueril instinto, que o honrava com alguns momentos de misericórdia,
a si mesmo no leito; relutante.  Vozes que outrora diriam:
Mais um tanto, e a face em nirvana - aguarde!
Não mais. (Possui regimentos e estatutos belicosos).

Indeciso? Nos refinamentos. Vide: Escolhas tropegas
Parece mais prático banhar-se; a água facilita a circulação.
(In)consequente estímulo às sinapses.
Daí, para a ração...Basta seguir o tom do comum.
Ao rufar de uma marcha de Mahler.