terça-feira, 5 de abril de 2011

La Cigarette


Deitada no divã, Lourdes vira rapidamente a cabeça para Otto, seu psicanalista. Olha por um tempo apenas para o pé de sua linda poltrona prostrada sobre o estofado azul e volta a olhar para cima... Caiam algumas lágrimas de seus olhos ao passo em que ela refletia sobre a necessidade de ter de falar.

Otto, pacientemente espera passar aquele pequeno momento de euforia e perplexidade apenas acendendo uma cigarrette - até porque, sendo muito sincero consigo, de que importava falar alguma coisa para aquela tola? Assim, passaram-se 15 minutos e o olhar de Lourdes ainda estava no teto, na verdade ela contava todas as aranhas naquele lugar frio e úmido.

Otto então levanta-se de sua linda cadeira, em madeira escura como nenhuma outra, e dirige-se ao outro divã. Neste momento, Lourdes encontrava-se estirada, tal qual uma flecha, mas de repente já não mais assim estava. Otto sentou-se ao longo daquele confortável móvel, limpou a poeira com as mãos várias e várias vezes, até sua pele ficar vermelha e irritadiça. Deitou-se, então.

Lourdes colocou os óculos, sentou-se na cadeira - e aí já não mais carregava as lágrimas, mas um certo tom de perversidade... lembrara-se de Wolfgang, seu companheiro. Olhou aquele sujeito infeliz, infantilmente começando um movimento côncavo até atingir a posição fetal. Neste momento, o fumo de Otto já tinha chegado na piteira e seus olhos estavam fechados, ao passo que seu rosto estava lívido.

Lourdes, estirando o braço e apontando com o dedo, proclama em tom profético, majestoso: bem aventurados aqueles que amam na cama, pois um dia será deles um filho e rei dos céus; bem aventurados aqueles que olvidam, pois suas culpas passearam junto ao reino dos mortos; bem aventurados aqueles que se entregam, pois, antes de ser só, serão com alguém no reino da carne.

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