quinta-feira, 26 de maio de 2011

Assim falou o sistema: um livro para todos seguirem mais


Muito embora esta idéia já esteja um pouco ultrapassada por (já) novas correntes de pensamento, que como correnteza vêm levando todo o substrato indesejado, o direito ainda guarda uma certa via de metafísica. Isto ocorre no sentido de que mesmo no mais desvelado sistema legalista positivista - inclusive nos pós-positivismos - a idéia de um contorno imutável é sempre presente. Assim, podemos dizer com certeza, e clara e distintamente (tomando a via de Descartes - "clare & distincte"), o sistema pressupõe certas coisas como imutáveis e outras como nem tanto, ou seja, mutáveis. À primeira vista pode parecer que aqui se fala ainda de um direito natural ao que se entende no rigor moderno, e, mesmo quando contemporâneo, como em Habermas, algo como contendo certo retorno ao naturalismo (ainda que ele rejeite esta idéia em seu o pensamento pós-metafísico), mas, em realidade, o que se quer dizer, trazendo o debate para o que se compreende hoje como sistema, é que há um pressuposto velado de permanência, sendo dinâmico apenas o seu miolo menos estruturante.

Falou-se em outro texto na idéia de uma moldura do direito[1], e, assim, seguindo o raciocínio acima, dir-se-á à moda de Kelsen que o propriamente jurídico mantém seu sistema (estrutura), mudando apenas seu caráter material (normativo) no tempo. Isto preenche o pressuposto susomencionado. Assim, tudo o que é "imutável" construirá a base do jurídico: formam a cara específica do sistema (isto é, do direito em si) e, por conseguinte, do que lhe é próprio. E ainda, seguindo este filão, a parte "mutável" não deve funcionar como um jogo de lego, num monta e desmonta a bel prazer e a todo o tempo: isto levaria, sem dúvida alguma - e partindo deste pressuposto, que se alicerça inclusive, no poder de polícia, na vigilância e no controle (do que se deduz de Foucault) - à múltipla falência funcional dos orgãos do ser jurídico. É, obviamente, a idéia de que o sistema funciona no tempo e com o tempo, e, ainda, de forma altera, mas contida em si: uma espécie de self psicológico, mas com um quê de ego sobressalente – claramente uma contradição, pois se o sentido de self induz a relação “si próprio e o outro”, o ego afirma o si isoladamente; no primeiro sentido há um paradigma do social, já no último o sentido do (meta) individual imanentemente transcendente como único e o mesmo.

Este pressuposto, portanto, é tomado genericamente (algemeine) pelo sistema como verdade e interiorizado pelos doutrinadores e ensaístas da dogmática jurídica na cultura tanto teorética (das universidades) quanto da práxis (na burocracia dos tribunais). Perceba-se, é um modo de imposição que corrobora à supressão do diálogo da questão tanto da alteridade quanto da relativização deste pressuposto quanto à alteridade. E, aqui, a maior questão é: como um sistema impositivo através de sua dogmaticidade e supressão do debate das estruturas primeiras, a ordem manda calar o que não for necessariamente e diretamente interessante, mesmo partindo-se de uma teoria dos sistemas como em Teubner e Luhmann, e vandaliza o vandalismo, isto é, exclui a possibilidade de se repensar as bases, tomando-as como realidade em condição sine qua non, e parte da premissa de que apenas os paleativos são discutíveis. Assim, fica novamente a idéia do quadro, desta vez um pouco mais explorada e ampliada, onde a relação realidade-fantasia atesta o pressuposto trazido pela tradição e fantasia-fantasia incorpora a crítica ao fato convencionalista mesmo do sistema:


Por fim, muito embora se reconheça não ser de boa técnica terminar com uma citação, e tendo em vista que todas as conclusões já foram dadas, cabe ressaltar um trecho de Luhmann sobre o sistema: “Mesmo os modelos Input/Output admitem que em um sistema a sua própria saída pode ser utilizada como entrada.[2]



[2] Original: “Schon die Input/Output-Modelle hatten zugelassen, dass sein System seinen eigenen Output als Input verwenden kann.

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