domingo, 3 de abril de 2011

Sentimentos: uma visão heraclitiana


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Personagens do monólogo

Marcos
Le Coeur
Angústia

Cena: de frente para um espelho. Marcos terminara de assistir um filme cujo ator principal é Ricardo Darín. Há duas sombras sob a luz, uma é o Coeur e a outra a Angústia.
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Marcos olhando-se começa a falar:

Não faço idéia do que houve. Em algum momento deixei de ser gente. Já não é fácil sucederem-me sentimentos - e de quaisquer espécies -, pois parece que ante um nevoeiro me encontro e não vejo mais que minhas mãos. O mais estranho de toda esta relação é a quantidade de vezes que me coloco a repetir du coeur; muito embora, à medida em que as palavras retraídas dos sentimentos voam na forma de pensamentos, mais distantes do meu eu ficam suas substâncias; Do próprio coração...

É muito fácil mostrá-las, falá-las, representá-las - mas é claro! representá-las, de fato! Isto não passa de um teatro e eu sou o maior de todos os palhaços. Me escondo atrás de minhas performances e esqueço de meus sentimentos. Mesmo a angústia, como grande companheira, me dá esse traje escuro, que eu faço questão de disfarçar em vermelho. Se me pego a sentir, e me vem alguma vontade incontrolável de chorar, tento aumentá-la; mas como os contrários são a norma do consciente, vejo-me a racionalizar o que me sucede e permaneço frio por dentro, conquanto vermelho por fora.

A todos os momentos imagino um amor perfeito, sem perceber - apenas nesse pequeno momento da imaginação? - que já o tenho. Mas como já não o sinto, esqueço de notá-lo e continuo o meu caminho tendendo a mudar tudo o que me vem. Os asnos preferem a palha ao ouro, disse o filósofo; eu prefiro me esconder e ser asno a ser, realmente, o próprio asno, ou mesmo ser gente, como bem deveria. Na verdade, o grande prêmio me espera no dia do meu confrontamento, pois até lá, o império do não-eu sobre o talvez-seja irá privar-me do coeur, deixando-me ou apenas a palavra ou o espectro de tudo o que, para me apaziguar, me angustia.

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